Nos últimos dias, um vídeo do senador Cleitinho Azevedo (Republicanos-MG) viralizou nas redes sociais. Nele, o parlamentar critica a decisão do Exército Brasileiro de investir cerca de R$ 7 bilhões na compra de blindados, que ele classificou genericamente como “tanques de guerra”. O senador não entrou em detalhes sobre quais seriam esses blindados, tampouco explicou que o projeto é voltado, principalmente, para veículos de transporte de tropas com capacidade de proteger vidas de militares brasileiros em missões de combate ou segurança.
O alvo da crítica é o projeto de aquisição de 100 unidades do Guarani, um Veículo Blindado de Transporte de Pessoal (VBTP-MR 6×6), que faz parte de um amplo programa de modernização da frota terrestre do Exército.
Guarani: Não é tanque de guerra. É proteção de vidas.
Diferente do que o termo “tanque de guerra” sugere, o Guarani não é um blindado de combate pesado.
Ele é um veículo tático de transporte de pessoal, projetado para movimentar tropas com segurança em ambientes hostis, oferecendo proteção balística contra armamento leve e médio, além de explosivos improvisados.
Sua missão principal não é atacar, mas proteger os soldados brasileiros em operações de Garantia da Lei e da Ordem, segurança de fronteiras, missões de paz da ONU e outras situações de risco.
Além disso, o Guarani pode ser equipado com sistemas de comunicação modernos, sensores e armamento leve de apoio, mas está longe de ser um “carro de combate” no sentido tradicional.
Investimento em Defesa: Apenas 1% do PIB
Segundo o Banco Mundial e o SIPRI, o Brasil destina apenas 1,07% do PIB para a Defesa Nacional, uma das menores proporções entre as grandes economias globais.
Para efeito de comparação:
País | Percentual do PIB investido em Defesa |
---|---|
OTAN (mínimo recomendado) | 2% |
Índia | 2,3% |
China | 1,7% a 2% |
Brasil | 1,07% |
Ou seja, o Brasil investe metade do mínimo recomendado pela OTAN.
Como o Brasil gasta o restante dos 20% do PIB aplicados pelo setor público?
O setor público brasileiro consome cerca de 20% do PIB anualmente, com a seguinte distribuição aproximada:
Função / Área de Gasto Público | Percentual aproximado do PIB |
---|---|
Previdência Social (INSS + RPPS) | 8,5% – 9% |
Saúde pública | 4% – 5,5% |
Educação pública | 4,5% – 5% |
Segurança pública | ~1,5% |
Defesa Nacional | ~1% |
Assistência Social (ex.: Bolsa Família) | ~1% |
Juros da Dívida Pública (2023) | 5,5% – 6% |
Outras funções (infraestrutura, justiça) | 2% – 3% |
Ou seja, 99% do PIB estão sendo consumidos por outras áreas.
A Defesa continua com uma das menores fatias, apesar das responsabilidades estratégicas que o Brasil possui.
Senado: O custo que o senador não citou
Enquanto critica os R$ 7 bilhões investidos pelo Exército em um projeto com impacto de 30 a 40 anos, o senador Cleitinho Azevedo não mencionou o custo anual do próprio Senado Federal, instituição da qual faz parte.
Para 2025, o Senado tem orçamento previsto de R$ 6,317 bilhões.
Fazendo uma projeção simples:
Item | Valor |
---|---|
Aquisição de 100 blindados Guarani (vida útil de até 40 anos) | R$ 7 bilhões |
Custo anual do Senado Federal (2025) | R$ 6,317 bilhões |
Custo projetado do Senado em 40 anos | R$ 252,68 bilhões |
Ou seja:
Em apenas um ano, o Senado custará quase o mesmo que todo o projeto de blindados.
E, ao longo de 40 anos, o gasto acumulado da casa legislativa será mais de 36 vezes superior ao valor investido pelo Exército.
Por que a aquisição dos blindados é estratégica?
O Brasil tem:
-
16 mil km de fronteiras terrestres
-
4,5 milhões de km² de mar territorial
-
Riquezas estratégicas: petróleo, água, minérios, biodiversidade, produção de alimentos
Garantir a capacidade de deslocamento e proteção das tropas é uma questão de soberania.
Sem meios adequados, o Brasil fica vulnerável a ameaças externas e internas.
E vale reforçar:
Não se forma um soldado nem se adquire um blindado de última geração de um dia para o outro.
Nota Editorial: A Importância de Olhar Primeiro para a Própria Casa
Importante destacar que este editorial não é contrário ao direito do senador Cleitinho Azevedo de questionar investimentos públicos, muito menos de debater a modernização da Defesa Nacional. Pelo contrário: o controle social e o debate democrático são fundamentais em qualquer país. No entanto, o que se questiona aqui é a forma e o local apropriado para tal cobrança.
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Como senador da República, Cleitinho dispõe de canais institucionais próprios e respeitáveis para buscar as informações que deseja. Poderia, por exemplo, ter encaminhado um requerimento formal ao Ministério da Defesa ou solicitado uma audiência pública na própria Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) — a instância correta para esse tipo de questionamento no Senado Federal. Contudo, o senador não faz parte da CRE. Suas áreas de atuação estão concentradas em outras comissões como Assuntos Sociais, Comunicação, Ciência e Tecnologia, Direitos Humanos, Desenvolvimento Regional, Esporte, Infraestrutura e Meio Ambiente, como consta no site oficial do Senado.
👉 Antes de questionar com veemência projetos de outras áreas, é fundamental olhar primeiro para a própria casa.
👉 Será que todos os recursos destinados às comissões nas quais o senador efetivamente participa estão sendo aplicados até o último centavo? Estão todos os indicadores dessas áreas em situação irrepreensível? Há plena fiscalização sobre os orçamentos de saúde, educação, infraestrutura, meio ambiente e direitos humanos?
O debate sobre Defesa Nacional é legítimo, mas exige seriedade, responsabilidade institucional e respeito aos canais adequados.
Não se constrói um país forte com discursos midiáticos rasos, mas com controle responsável, técnica e diálogo entre os Poderes da República.
Defesa não é gasto. É investimento.
O vídeo do senador Cleitinho Azevedo abre um debate que o Brasil precisa fazer:
Como distribuir melhor os recursos públicos?
Mas atacar um investimento essencial, de longo prazo e com foco na proteção da vida dos nossos militares — ao mesmo tempo que se ignora o custo da máquina legislativa — é uma simplificação perigosa.
Defesa é investimento. É soberania. É segurança para as futuras gerações.
Fontes consultadas:
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Banco Mundial – Dados de gastos com Defesa (% do PIB):
https://data.worldbank.org/indicator/MS.MIL.XPND.GD.ZS -
SIPRI – Stockholm International Peace Research Institute – Military Expenditure Database:
https://www.sipri.org/databases/milex -
Portal da Transparência do Senado Federal – Orçamento 2025 (SAFIN – QDD Volume III):
https://www12.senado.leg.br/transparencia/orcamento-e-financas/safin/qdd-2025-lei15121-volume-iii.pdf -
IBGE – Agência de Notícias – Gasto público em Saúde:
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br -
Tesouro Nacional – Relatório Contábil da União:
https://www.tesourotransparente.gov.br/ -
Senado Federal – Perfil Parlamentar do Senador Cleitinho Azevedo:
https://www25.senado.leg.br/web/senadores/senador/-/perfil/6127
📌 Por Defesa TV – Jornalismo especializado em Defesa, Estratégia e Segurança Nacional